28 mar 2009

Roberto Cardodo de Oliveira e Ítalo Calvino


Tanto em A palavra escrita e a não-escrita, Ítalo Calvino como em O Trabalho do antropólogo: olhar, ouvir, escrever  de Roberto Cardoso de Oliveira, está posta a existência de dois mundos que se relacionam, mas que nunca chegam a se identificar completamente: o mundo da escrita (ou “ estar aqui”) e o mundo não escrito, o vivido (ou “estar lá” e a conseqüente utilização das faculdades da percepção).

O mundo real –não-escrito – é aquele cujo âmbito é o do inesperado, do caos, no qual as coisas efetuam-se sem conexão lógica, sem temporalidade definida e sem relações de sentido. Se fosse possível olharmos esse domínio livres de nossas “representações coletivas”, provavelmente não veríamos mais que fluxos de acontecimentos e seríamos constantemente atingidos pelo repentino e pelo impremeditado. Calvino mostra indícios dessa incapacidade de apreensão absoluta do real a partir das frestas no sentido que o cotidiano talha quando comparamos seu turbilhão de acontecimentos com o monolítico textual: constatação simples, bastando tirar os olhos do papel e “descobrir um mundo bem diferente da página escrita” 1.

O texto, por sua parte, é baseado em uma linguagem – a palavra escrita – que possui seus mecanismos próprios, sendo as relações entre significante e significado e entre um signo e outro estabelecidos de maneira relacional e arbitrária, tendo peso nulo a suposição de uma afinidade essencial e de natureza entre o signo lingüístico e o referente. Ao escrever sobre o real e ao contarmos uma história (fictícia, jornalística ou científica) que organize o que vemos, usaremos sempre essa linguagem e é através dela que o mundo terá sentido. Decodificamos, então, a realidade porque utilizamos mecanismos cujas regras já estão estabelecidas e, baseados nelas é que podemos extrair a realização de experiências, a criação de conceitos ou de imagens. O mesmo seria impossível caso esperássemos que fosse o mundo aquele responsável pela criação de referências próprias, tendo em vista que sua matéria é caótica e não possui indícios de intencionalidade.

Mas não é por funcionarem de maneira própria que mundo e texto não possuem ligações. Pelo contrário, Calvino coloca que é exatamente para escrever que devemos olhar o mundo, assim como é pelo olhar e pelo escutar que Cardoso de Oliveira vê a possibilidade de tornar vivas as relações sociais, construindo significações e sentidos. Portanto, encontra-se em ambos a importância dada à percepção, mesmo que esta não seja mobilizada para os mesmos fins: enquanto o primeiro autor está preocupado com a criação de imagens estéticas, o segundo se empenha em engendrar conceitos a fim de legitimar a Antropologia como Ciência Humana. Essa diferença de posicionamento com relação ao que se percebe pode ser observada, inclusive, nas críticas tecidas por um, à ambição científica da área de humanas 2 e, pelo outro, ao viés literário da disciplina antropológica, taxado como característico de um “olhar ingênuo”.3 Entretanto, nem Cardoso de Oliveira está interessado em predizer o futuro das sociedades, nem Calvino pensa em descrever o mundo sem um olhar disciplinado.

Para o escritor italiano se trata de ser disciplinado no sentido de se livrar de uma outra disciplina (a do senso comum) adquirida pelo costume, de nos livrarmos das palavras e dos conceitos para ver o mundo como se fosse pela primeira vez. “Ser ingênuo”  é conseqüentemente fundamental para a escrita artística, tão ingênuo ao ponto de escrevermos mesmo sobre aquilo do que nos sentimos distantes, como é o caso dos cinco sentidos. 4 A partir desse exercício descobrimos nossas próprias imagens estéticas, “ nossa moral”  e o “ nosso eu” 5 e realizamos a escrita não só como luta contra o caos de onde vem a sua matéria (organizando-o) mas sobretudo contra aquilo que reduz o que é inapreensível (o mundo) aos clichês.

Exatamente para se aproximar do que está distante é que Cardoso de Oliveira estabelece as faculdades perceptivas como típicas da antropologia. Mas ao contrário de adotar uma fenomenologia da percepção a partir da qual olharíamos para a superfície das coisas e veríamos sua essência, o antropólogo utiliza uma idéia cara à disciplina 6 – a observação participante – e, baseando-se na hermenêutica (criação de um espaço singular de intersubjetividade), valida o encontro etnográfico como aquele que possibilita um conhecimento profundo da sociedade estudada, a partir do que o pesquisador vê e ouve quando em campo. O “olhar ingênuo” (de um literato ou de um médico) seria, nesse caso, aquele que não se baseia nos conhecimentos e na tradição antropológica, só sendo reprovável na medida em que não contribui para o desenvolvimento deste campo científico específico.

Concluímos, enfim, que tanto Calvino quanto Cardoso de Oliveira visam traçar as linhas que, partindo da mesma matéria – o caos, o “mundo móvel” 7, a “ natureza morta” 8– a recortam e ao mesmo tempo se consolidam como diferentes tipos de pensamento: um, o artístico e o outro, uma mescla de pensamento científico e filosófico. Digo um misto porque Cardoso de Oliveira cobra da Antropologia bases típicas à ciência, como a necessidade de que os autores controlem os dados etnográficos 9, dotando portanto dotando as teorias de falseabilidade (já que leitores poderão julgar com segurança e a partir do que lêem); ao mesmo tempo em que dá à mesma status filosófico, uma vez que a capacita a criar conceitos que fazem parte de uma moldura maior (paradigma ao qual fazem parte) passíveis de mudança em decorrência da experiência de campo. 10



1 Ítalo Calvino, “A palavra escrita e a não-escrita”, in Marieta de Moraes Ferreira e Janaína Amado (orgs), Usos e Abusos da História Oral, p. 140.
2 Idem, p. 141.
3 R. Cardoso de Oliveira, O Trabalho do Antropólogo, São Paulo, UNESP, p. 20. 
4 Ítalo Calvino, “A palavra escrita e a não-escrita”, in Marieta de Moraes Ferreira e Janaína Amado (orgs),Usos e Abusos da História Oral, p. 147.
5 Idem, p.146.
6 R. Cardoso de Oliveira, O Trabalho do Antropólogo, São Paulo,UNESP, p. 33.
7 Ítalo Calvino, “A palavra escrita e a não-escrita”, in Marieta de Moraes Ferreira e Janaína Amado (orgs), Usos e Abusos da História Oral, p. 140.
8 R. Cardoso de Oliveira, O Trabalho do Antropólogo, São Paulo, UNESP, p. 20.
9 Idem, p. 29.
10 As afirmações sobre a existência de formas diferentes de pensamento enquanto arte, ciência e filosofia (e suas respectivas singularidades) foram baseadas em Deleuze e Guattari, O que é a filosofia?, São Paulo, Editora 34.










23 mar 2009

Me supone demasiado esfuerzo
hablar en un tono adecuado
cuando un drogodependiente
es un yonas
y un PSH
un vagata.

Comentar cosas como
“la heroína destrozó su vida”
cuando sé que fue el jaco
aquel que no le dejó en la cuadra,
cuando ninguna penitenciaria
hace estragos en los reos
sino que el boqui le quemó
los cojones con una vela
a ese gitanillo que bailaba
fandangos sobre las nubes
del estaribel.

Me toca la polla pensar
en proxenetas que recuerdan
a los psicólogos de la vieja Europa;
en cambio, un chulo me evoca
a la bala pendiente que tengo
para reventar cabezas a sangre fría,
sembrar justicia entre las putas
de Montera y La Puebla.

Me quema lo políticamente correcto,
en el momento en que la política y sus esbirros
vierten sangre de tomate frito en los periódicos,
en el instante en que encienden fuegos
sobre leña mojada.

Me cansa lo socialmente correcto y sus borregos
cuando tachan de incorrecto y vulgar mi vocabulario,
y usan su exquisita terminología y su arrogante división humana neocapitalista (jodidos hipócritas que hablan de Marx en el almuerzo)

Y es que, tronco, me parto la caja
de tanta palabrería y de tanto cambio,
de redes y nódulos castellianos,
si ni siquiera tenéis huevos
a mojaros y olvidar tanta mierda técnica
y decir que un yonkarra, un drogodependiente,
una puta, una persona sin hogar,
no es más que tú y yo,
un dulce y arrogante ser humano.

6 mar 2009

¿Cómo será que ando perdiendo
cada canción que te regalé
en mi monedero de Guevara?
No entiendo el por qué
de estas cosas;
busco y rebusco y nada,
¡no lo encuentro!

Será que anoche no dejaste
ningún suspiro en mi buzón,
que al entrar por la puerta
sólo oí el “¿qué tal?” amargo
de mi padre,
que aún viajo para no encontrarme,
que mi mora se pudre de asco y vida
en la Ciudad Luz.

No entiendo qué sucede
cuando sólo pienso en el sudor de tus labios,
cuando deseo la enfermedad
a cualquier atisbo de humanidad,
cuando quiero encontrarme
con el gris de tus ojos
en ese feo local verde
de geranios y radios rotas.

Me arden los dedos
por no versificar mi tratado
ateológico, mi pequeña y dulce
revolución.
Ese mundo mágico
en donde las praderas
aparecen partidas
y en donde una rosa no sea una mujer
sino un ridículo chocho arrugado.

Y, fíjate, que ya me lo dijeron
los jóvenes poetas:
la poesía actual sale de la mierda,
y dale que dale, que a mí me sale
de la bragueta.

Pero a medias, eso sí,
mitad para un pene de carbón,
mitad en busca de la percha
donde guardas cada noche tu corazón.
Una bonita percha de madera,
color ocre y olor a almendro,
con la textura del niño que no despuntó tu vientre,
con el sabor a sal de la playa
donde nunca bailé para ti.

Y es que no puedo,
¡no puedo!
Ni escribir los versos más tristes esta noche,
ni el último verso que te escribo.
Y es que me muero
¡me muero!
porque lloro y escribo,
como un compás dando vueltas
sobre una papel en blanco;
dando vueltas
sin ningún sentido.

5 mar 2009

Poesía

Mi poesía es una poesía para todos y para nadie,
sonreir en el desván de los sueños,
despertar en un somier de Bod Zizhigu.

Mi poesía es obvia para todos y anónima para mi mente,
André Breton cantando bajo la lluvia,
Kavafis buscando caminos.

Mi poesía es el mundo y el espacio,
un corazón sin orbita,
un rey destronado.

Mi poesía es paz y guerra,
un Bhodhisattva drogado,
un pico de jaco en mi brazo.

Mi poesía no es poesía,
es un cuerpo flotando,
la savia de los labios
sin los labios,
no rozar las pieles,
morirme en los abrazos.

2 mar 2009

Homem, muito mais uma posição do que aquilo
que você é
pode deixar de sê- lo sem perder seu pênis
Tranqüilidade
Só que não se sabe se é você que ocupa
a posição
é que ocupa você
Talvez para uma mulher seja a coisa
que a ocupe
Caso contrário, você que ocupe a coisa.

Avariada

Como máquina que de súbito perde o ritmo
alguma peça saiu do lugar
Perde-se o mundo equilibrado que ela engendrava,
clitóris apita cabeça chacoalha imóvel
braços e pernas convulsionam por dentro
Não há reconhecimento do ao redor porque os limites
do ponto de vista se voltaram para dentro.
Estou ossificada e a dureza é também agonia
Ouço barulhos, sonidos vindos do interior e
que me assustam como se não fossem eu
É porque agora me volto para fora
como se estivesse desatenta a mim mesma
Sempre a espasmos; queria que alguém me esticasse
estou contraída, inteira.